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sexta-feira, 30 de junho de 2017

Terapia

Sempre fui apaixonada por poesia. Desde que me entendo por gente mesmo. Mal sabia pronunciar palavras, já queria atenção para recitar "Batatinha quando nasce", daquele jeitinho errado, adaptado para as crianças.

Existem muitas fontes que dão diferentes versões sobre esses versos. Uma, em particular, me pareceu bastante verossímil e explica que a poesia original foi escrita em alusão aos assédios de patrões sobre mucamas na época da escravidão. Segundo a fonte, ela foi registrada em 1885 por Silvio Romero, conforme segue:

Batatinha quando nasce
Deita rama pelo chão
Mulatinha quando deita
Bota a mão no coração

Completamente alheia a tudo isso, a poesia era então, para mim, sinônimo de alegria, amor e momentos em família. De certa forma, ela era segurança e empoderamento.

Veio então a adolescência e toda sua intensidade. Ansiedade, confusão, pensamentos e sentimentos demais a serem administrados por uma pessoa que se debatia bastante para entender o mundo. Nessa época comprei um caderno daqueles grandes de espiral e fui depositando nele as poesias que fui descobrindo. Algumas foram encontradas e inseridas por amigas, outras por mim, e assim fui colecionando. 

Eu vivia para cima e para baixo com aquele caderno. Tenho uma lembrança clara de estar com o trambolhinho num dos vários almoços semanais na casa da minha nona e, vez ou outra, fugir para ler uma coisinha ou outra que me trouxesse paz. Novamente a poesia me fazia sentir empoderada. Naquelas páginas eu encontrava junções de palavras cadentes que soavam como música, compreensão e empatia. O consolo que eu precisava para a forma intensa com que vivia tudo.

Algumas poesias eu li tantas vezes que decorei. E até hoje, dependendo da situação, como numa sessão de auto terapia, lembro das mais lidas e as recito mentalmente até o fim. Como essa aqui:

Ah, tormento que eu não posso confessar...
O que eu escrevo é a verdade, eu não minto,
eu declaro tudo aquilo que sinto,
e é a outra que teus lábios vão beijar...

Sei que quanto mais verdade tem no escrito,
mais distante eu te ponho dos meus braços,
pois desenho o paralelo de dois traços
que na certa vão perder-se no infinito...

Estes versos feitos pra te emocionar
Justificam todo o amor que tens por ela
e as carícias que esses dois amantes trocam.

E eu te excito, sem que venhas a notar
que esses lábios que tu beijas são os dela,
mas são minhas as palavras que te tocam.

Pedro Bandeira


segunda-feira, 26 de junho de 2017

Quem Me Leva os Meus Fantasmas



De que serve ter o mapa se o fim está traçado
De que serve a terra à vista se o barco está parado
De que serve ter a chave se a porta está aberta
De que servem as palavras se a casa está deserta

sábado, 3 de junho de 2017

Tempo

Um átimo bastou pra conceber
O beijo amanhecido no cerrado
Braços pintados, ansiosos, a tremer
Me envolveram o coração já conquistado.

A magia então por verbo se desfez
E a inconstância condenou a desgarrado
Se por vias de mistério o amor se fez
Pelas cordas da distância foi atado.

Tempo instável, tempo vil, discricionário
Que quando ela está longe me consome lento
Que quando pousa em meu abraço é vento

Pare um pouco - ela chegou, silêncio:
Se amar é um ato revolucionário
Dê uma brecha pr'eu lutar por esse alento.