"O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração."
Fernando Pessoa
Aqui tem de tudo. Eco e tino. Sangue e prazer. Amor e fúria. Devaneio e feminismo. Aqui eu abro meu coração sem pretensão. Encho essas páginas para libertar minha mente.
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terça-feira, 5 de junho de 2012
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
Eu quero uma noite feliz
Eu quero uma noite feliz dentre tantas tristes, ter uma invasão noturna e uma visão que excite. Um romance aberto, quase sem frescura, quero amargurar as bênçãos que me estupram. Eu quero sentir que meus segundos pesam, seja num cinema ou num boteco estéril; quero que a esquina seja um mero prédio, e que meus pertences sejam mais eternos. Quero que meu sexo seja fugido, quero amanhecer e me encontrar distante, ficar na penumbra não ligar de onde, quero que ninguém saiba onde se esconde. Preciso de beijo no intervalo mudo, criar um criado momento de tudo, quero que o meu sangue seja de uva pura, e queira ser passado pelas linhas duras. Quero amor à noite e café na varanda, quero trabalhar para sair distante, quero voltar tarde e saber que não pode, quero sacanagem, madrugada forte. Preciso de vida para os meus desejos, quero mais desejos para os meus gracejos, saber que além do meu peito estende-se perfeita uma linha tênue que define o tempo. Quero extrapolar as regras societárias, desestruturar as telhas operárias, provar que o mundo não é para todos, que para a carona o que não falta é louco. Vejo o motorista a cruzar a rua, vejo o imbecil que pouco sabe e atua, sinto seu desprezo e depois me lembro que meu campo é outro, meu silêncio é ouro. Ouço estardalhaços, baixo meus instintos, gritam na minha cara e eu quieta lembro que não sou de nada, que estão todos certos, pois meus objetos não se compram retos. Preciso sair aos campos de batalha, deitar nas trincheiras e pintar a cara, não tenho mais lenha para ver faisqueiras, quero mais incêndio nessa minha campeira.
terça-feira, 27 de dezembro de 2011
O certo e o errado
O ser humano é vulnerável e sofre muito em razão da sua ignorância. Esta, que consiste na culpa que sente por se cobrar constantemente pela definição e cumprimento do certo e do errado mas que, sendo estes relativos, não podem ser definidos. Sua definição é individual e baseada em crenças.
Uma mesma ideia é verdade absoluta em um momento e pode virar um erro enorme logo depois, dependendo da pessoa com quem se conversa, o filme que se vê ou o livro lido. A visão e versão dos fatos que o ser humano propõe ao outro é extremamente afetada pelo que vive e nutre durante a vida. Quando se passa a acreditar que algo é certo, tudo o que se vê parece concordar, reforçar e provar o fato. Já se algo influencia de forma diferente o sujeito, tornando-o cético, seja dois minutos ou dez anos depois, seja por qual motivo for - doloroso e marcante ou mesmo simples, todo o universo parecerá conspirar a provar o contrário do que antes se havia dito. E então, aquilo que outrora era defendido como verdade incontestável, passa a ser obviamente errado.
sexta-feira, 12 de agosto de 2011
Pisar na eternidade
"Fazer amor é coisa séria demais... Não basta um corpo e outro corpo, misturados num desejo insosso, desses que dão feito fome trivial, nascida da gula descuidada, aplacada sem zelo, sem composturas, sem respeito, atendendo exclusivamente a voracidade do apetite. Fazer amor é percorrer as trilhas da alma, uma alma tateando a outra, desvendando véus, descobrindo profundezas, penetrando nos escondidos, sem pressa, com delicadeza... Porque alma tem tessitura de cristal, deve ser tocada nas levezas, apalpada com amaciamentos... Até que o corpo descubra cada uma de suas funções. Quando a descoberta acontece, é que o ato de amor começa. As mãos deslizam sobre as curvas, como se tocando nuvens, a boca vai acordando e retirando gostos, provando os sabores, bebendo a seiva que jorra das nascentes escorrendo em dons, é o côncavo e o convexo em amorosa conjunção. Fazer amor é ressurreição. É nascer de novo: no abraço que aperta sem sufocamentos, no beijo que cala a sede gritante, na escalada dos degraus celestiais que levam ao gozo. Vale chorar, vale gemer, vale gritar... porque aí já se chegou ao paraíso e qualquer som há de sair melódico e afinado, seja grave, agudo, pianinho... Há de ser sempre o acorde faltante quando amantes iniciam o milagre do encontro. Corpos se ajustaram, almas se matizaram... Fez-se o êxtase! É o instante do amor, da paz... É a escritura da serenidade, sabedoria! E os amantes em assunção, pisam eternidades."
quarta-feira, 27 de julho de 2011
Não entendo.
Gênio essa mulher! Não entender e se permitir isso, com inteligência, é a alegria da ignorância, de viver sem angústias e medos. Muitas vezes não entender é a paz.
"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."
Clarice Lispector
"Não entendo. Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender. Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras. Sinto que sou muito mais completa quando não entendo. Não entender, do modo como falo, é um dom. Não entender, mas não como um simples de espírito. O bom é ser inteligente e não entender. É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida. É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice. Só que de vez em quando vem a inquietação: quero entender um pouco. Não demais: mas pelo menos entender que não entendo."
Clarice Lispector
terça-feira, 3 de maio de 2011
Porque sim.
E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta se faz murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos - eu sei, ah, eu sei que o meu amor por você é feito de todos os amores que eu já tive, e você é a filha dileta de todas as mulheres que eu amei; e que todas as mulheres que eu amei, como tristes estátuas ao longo da aléia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão até mim, cuspindo no seu rosto e enfrentando a sua fronte de grinaldas; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações - porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor.
Vinicius de Moraes
terça-feira, 19 de abril de 2011
Grão de Amor
Me deixe sim
Mas só se for
Pra ir ali
E pra voltar
Me deixe sim
Meu grão de amor
Mas nunca deixe
De me amar
Meu grão de amor
Mas nunca deixe
De me amar
Agora as noites são tão longas
No escuro eu penso em te encontrar
Me deixe só
Até a hora de voltar
No escuro eu penso em te encontrar
Me deixe só
Até a hora de voltar
Me esqueça sim
Pra não sofrer
Pra não chorar
Pra não sentir
Pra não sofrer
Pra não chorar
Pra não sentir
Me esqueça sim
Que eu quero ver
Você tentar
Sem conseguir
Que eu quero ver
Você tentar
Sem conseguir
A cama agora está tão fria
Ainda sinto seu calor
Me esqueça sim
Mas nunca esqueça o meu amor
Ainda sinto seu calor
Me esqueça sim
Mas nunca esqueça o meu amor
É só você que vem
No meu cantar meu bem
É só pensar que vem
Láia laia
No meu cantar meu bem
É só pensar que vem
Láia laia
Me cobre mil telefonemas
Depois me cubra de paixão
Me pegue bem
Misture alma e coração
Arnaldo Antunes
Depois me cubra de paixão
Me pegue bem
Misture alma e coração
Arnaldo Antunes
segunda-feira, 18 de abril de 2011
Bipolaridade - Mode: on.
Cecília Meireles me lembra aulas de português da terceira série do Ensino Fundamental!
Não estranhem a aparição dessa poesia no blog mais uma vez, eu tenho o importuno costume de postar ele sempre que estou atravessando períodos de TAB. Enjoy, guys:
Não estranhem a aparição dessa poesia no blog mais uma vez, eu tenho o importuno costume de postar ele sempre que estou atravessando períodos de TAB. Enjoy, guys:
sexta-feira, 15 de abril de 2011
Ausência - Vinicius de Moraes
O entendimento de um escrito se dá pelo que se está vivendo, lendo, fazendo, sentindo. Às vezes a explicação de alguém também nos ajuda a compreender o que o autor quis dizer. Mas não é só para que saibamos o que se passava na cabeça do poeta que a poesia é feita.
A poesia também nos ajuda a explorar nossos próprios sentimentos, os inatingíveis pelas nossas pobres palavras e pensamentos, sentimentos penumbrados dentro de nós, pois estes, quando conseguem ser traduzidos em palavras que tocam - e palavras são fáceis de achar; achá-las e anexá-las criando uma cadência musical, de forma que nos toque, isso é difícil; para tanto é imprescindível a maestria do verdadeiro poeta -, nos fazem sentir vivos.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2011
Avec le ventre
Dos mais sábios conselhos que recebi
Quando partia àquela viagem de solidão (a boa solidão)
E desafios, e possíveis memórias inesquecíveis
Em meio à insegurança do desconhecido
Temendo os visíveis riscos,
A saudade, a dor, a solidão (aquela que é ruim)
O mais simples imperou:
Il faut pousser avec le ventre, ela disse
E a preocupação se esfarelou.
Quando partia àquela viagem de solidão (a boa solidão)
E desafios, e possíveis memórias inesquecíveis
Em meio à insegurança do desconhecido
Temendo os visíveis riscos,
A saudade, a dor, a solidão (aquela que é ruim)
O mais simples imperou:
Il faut pousser avec le ventre, ela disse
E a preocupação se esfarelou.
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